Despedida

28/07/2020

Tudo me parece uma despedida.

Há uma urgência em deixar feito, escrito, fechado, resolvido, dentro do possível, sem pontas soltas, do meu lado, pelo menos, e atirado para o mundo.

Uma última oportunidade

Até então, as décadas sucederam-se sem tormentos de maior. Com a apreensão dos números com zeros, o medo da responsabilidade que vem com as datas redondas, não a querer… Nada como agora. Nem os 40…

Quando percebemos que já não temos a vida toda pela frente.

A impermanência dos 20s, de não saber o que fazer com a existência, de querer forçar uma série de caminhos, numa urgência social, parece, aos 40, quase um desperdício de juventude. A ansiedade da viragem para os 30, uma piada. De bom gosto, até.

Não esta…

Não é consciente, não sei porque o faço, de onde vem a urgência, a vontade de avançar sem pendências. A minha intuição deve saber, o meu inconsciente saberá certamente. Apenas me limito a não oferecer resistência. A fazer, fechar, deixar pronto.

A despedida de alguma coisa, alguéns, de mim, do mundo como o conheço, da vida como a vivi.

As memórias e as canetas e lápis de todas as cores espalham-se pelo chão da sala. Divididas por décadas, umas mais cheias do que outras. Anos inteiros, seguidos de ausências de registos.

Outros com registos demais.

Enquanto espero por fotografias de tempos dos quais mal me lembro, e ganho coragem para digitalizar e imprimir outras tantas, descubro cartas que nunca cheguei a enviar, fúrias antigas de amores que voltei a considerar. Esqueletos saltam dos armários, aproveitando o tempo que passou e a memória que se esvaiu, tentam resgatar o tempo perdido, agindo como se tivessem menos 20 anos, não tivessem aprendido nada, de nada tivesse valido. Uma surpresa. Não me lembrava de muita coisa, afinal. Escolhi, salvo raríssimas exceções, guardar na memória os momentos especiais.

Bons, únicos, verdadeiros, até.

Lembrava-me que havia deitado fora correspondência antiga, num momento de fúria, convencida de que seria suficiente para esquecer. Agora, tenho pena de não ter guardado. Ainda que fosse mais uma demonstração de um ciclo vicioso.

De neurose…

Que ora quebro, com autonomia, por vontade própria, sem precisar que o outro o oficialize.

Descubro o texto que escrevi no último dia da minha estadia no Luxemburgo, onde estagiei no Parlamento Europeu durante três meses, em 1997. Uma carta de despedida que fala de lugares de que já não me lembro. E de um bar chamado Scots…

Esta foto é desse dia…

Descubro que escrevo sempre mais quando viajo para fora dos lugares que já conheço. Que o desconhecido, a descoberta, me inspira mais do que qualquer outra coisa.

Que a magia não acabará enquanto tiver olhos que a acolham. 

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