Creio que o verdadeiro valor da psicologia analítica talvez seja o de nos fazer compreensíveis para nós mesmos e, por conseguinte, toleráveis para nós mesmos.
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O inconsciente é como um sótão em que está guardado todo o material inutilizado ou inutilizável de nossa experiência pessoal e tribal, na maior confusão: antigas fotografias de casamento, o xale da avó, os diários do bisavô. Esses materiais afloram da mixórdia por acaso, como acontece quando crianças brincam no sótão ou uma criada curiosa começa a revirar relíquias empoeiradas. A natureza não está armada para nos enganar. Nem mesmo nós próprios estamos armados para nos enganarmos. Acontece apenas que não podemos enfrentar ao mesmo tempo todas as informações e emoções que nos são transmitidas. Assim, consignamos uma parte para o sótão do inconsciente.
In: “Um mundo transparente”, Morris West.
Eu faço o paralelo disso com a casa, que por mais arrumada que esteja, tem sempre um gaveta, uma prateleira, uma mesa para onde se atira a porcaria toda que naquele dia ou naquela semana não vamos conseguir processar. E há um dia que pegamos naquilo tudo e arrumamos. Mas claro, numa escala muito mais pequena e suportável.
a escala é kairos, para tudo, pras gavetas com lixo e pro sótão escuro e esquecido, é quando estamos preparados pra isso. ;)