No outro, dia mandei esta imagem, com a legenda: “I most certainly did”, a uns amigos. Depois, fiquei a pensar se não seria o caso de viver essas outras vidas, mas não a minha.
Um disparate, naturalmente.
Primeiro, porque também vivo a minha, depois, porque vai muito além disso.
O que conta é a experiência, claro. No entanto, para o cérebro, não existe diferença entre viver de facto uma experiência e vivê-la na nossa imaginação.
As experiências que não poderemos ter, por serem crime, por exemplo.
A Neurociência já postulou que, para o cérebro, as emoções que a experiência vivida na nossa imaginação despertam são tão reais quanto as que vivenciamos numa experiência factual, real. Basta pensar como reage o nosso coração quando vemos, por exemplo, um filme de suspense.
Na vida, vivemos com limitações de toda a ordem. Na imaginação não.
De resto, há inúmeras vantagens psíquicas no uso da imaginação. Os melhores exemplos que conheço são Tarantino e Stephen King. Qualquer um deles estaria preso para o resto da vida se pusesse em prática o que vive na imaginação, na criação.
Contudo, ao vivê-lo na criação, na imaginação, retiram o conteúdo psíquico da sombra, integrando-o na consciência. O que dá origem a um alívio psíquico extraordinário. E à resolução de complexos, cujo conteúdo foi liberto do inconsciente, não mais a ameaçando, com a sua autonomia psíquica, característica de todos os complexos.
Por outro lado, na imaginação, pela via dos símbolos e do que despertam, vivemos também o sublime, a plenitude, o divino, a conexão total com a nossa alma, o numinoso. Como quando somos tocados por uma música, uma visão da natureza, um objeto, um filme, um personagem.
No outro dia, bastou-me entrar no Hotclube, ver um piano, a luz sobre o palco, o ambiente intimista, para me invadir a paz que normalmente acontece quando estamos verdadeiramente plenos.
Nem sempre é um mar de rosas. A mais recente biografia de Hermann Hesse: The Wanderer and his Shadow, tem sido ao mesmo tempo difícil e voraz. As semelhanças, às vezes nos mínimos detalhes, chegam a ser assustadoras. Estamos certamente na presença de um arquétipo.
E não há nada mais real do que isto: identificação existencial.
Ainda que ele, talvez por ser homem, seja mais radical do que eu, a única diferença é que Hermann Hesse já havia escrito cinco livros aos 23 anos. Coisa pouca.
Vivemos milhares de histórias, inclusive a nossa.
Se não podes vivê-los, lê-os.